POR JOAO VICTOR GUIMARÃES
Bahia ocupa o MAR
Exposição Brasil Futuro: As Formas da Democracia abre ao público neste sábado, 9, no Museu de Arte do Rio (MAR)
A mostra Brasil Futuro: As Formas da Democracia, é a única em circulação no Brasil que tem como tema e motivação um processo histórico recente: a reconquista da democracia. Segundo Lilia Schwarcz, antropóloga, historiadora, vencedora do Prêmio Jabuti 2023 e uma das curadoras da mostra, era necessário fazer algo que fique na memória das pessoas. Para Lilia, “após quatro anos de governo do Jair Bolsonaro, o grande tema seria democracia. Democracia não como projeto completo, mas justamente como um projeto por definição incompleto, um processo, porque direitos a gente nunca acaba de constituir”.
Aceitando sua incompletude, a exposição buscou viajar pelo Norte e Nordeste do país escutando, inserindo e valorizando artistas e curadores/as de cada cidade por onde passou, efetivando o diálogo interno e a busca eterna pela equidade de gênero, raça, sexualidade, suportes, técnicas, perspectivas etc, bem como adotando, por exemplo, uma carga horária e remuneração justas para os/as profissionais envolvidos/as, feito raro nas produções culturais brasileiras. Sobretudo aquelas que vão ao Norte e Nordeste tendo em mente que o trabalho aqui vale menos do que o trabalho no Sul/Sudeste. Aliás, por adotar uma postura absolutamente democrática é que Brasil Futuro: As Formas da Democracia se propôs uma curadoria horizontal.

Foto: Fernando Vivas/GOVBA
Aberta o público no dia 2 de janeiro de 2023 no Museu da República, em Brasília, a mostra passou pela Casa das Onze Janelas, em Belém, Pará, e também pelo Centro Cultural Solar do Ferrão, em Salvador, Bahia, onde chegou a contar com mais de quinhentas obras. Parte considerável dessas obras, são do Acervo da Laje e do Arquivo ZUMVÍ Afro-Fotográfico que também fazem a curadoria da mostra.
Responsável pela preservação de registros e obras raras, o ZUMVÍ Arquivo Afro-fotográfico é hoje formado pelo fotógrafo Lázaro Roberto e pelo seu sobrinho e produtor executivo, José Carlos Ferreira. O ZUMVÍ é uma iniciativa oriunda das periferias de Salvador ainda na década de 90, na qual encontramos fotógrafos negros que, desde a ditadura militar, destruíram paradigmas relacionados à imagem dos corpos negros saindo da teoria e registrando corpos negros em momentos de luta, glória, beleza e serenidade em Salvador, cidade mais negra do mundo fora do continente africano. O Acervo da Laje, fundado por José Eduardo Santos e Vilma Santos, é um museu-casa-escola reconhecido nacionalmente, baseado no Subúrbio Ferroviário de Salvador que busca, segundo José Eduardo, “conciliar a arte popular. Tirá-la do lugar de arte popular e colocá-la como arte-arte. Nomeá-la com a autoria de seus artistas porque o Brasil fez um processo de apagamento muito grande”.

Foto: Fernando Vivas/GOVBA
Sobre o processo de curadoria conjunta, horizontal e democrática, José Eduardo, afirmou: “a gente se cuidou, a gente se tratou, a gente delegou coisas, a gente pensou tudo ali junto. Não teve o olhar da pessoa individual, tudo foi junto desde o início, porque não queríamos reduzir o Acervo da Laje a uma experiência de projetos sociais, por exemplo. Estamos lidando com estética, e as estéticas da periferia têm uma coisa que ainda não está nos grandes museus”. Uma mostra denominada Brasil Futuro com curadoria das periferias de Salvador, demonstra um Brasil anos luz à nossa frente, embora tão perto e presente agora no MAR.
João Victor Guimarães é crítico de arte, pesquisador, curador, graduando em Artes pela UFBA e colabora com as Revistas Dasartes, Select e Bravo!