Trilha Sonora. Foto: Pedro Motta

DASARTES 108 /

JOSÉ DAMASCENO

JOSÉ DAMASCENO É UM DOS ARTISTAS BRASILEIROS COM GRANDE INSERÇÃO NO CIRCUITO INTERNACIONAL DE ARTE CONTEMPORÂNEA, RECONHECIDO PELAS MÚLTIPLAS LINGUAGENS COM QUE OPERA, PELA ESCALA AGIGANTADA DAS PEÇAS, ALÉM DO CARÁTER REFLEXIVO DE SEUS TRABALHOS. CONVIDAMOS O ARTISTA PARA CONTAR EM DETALHES O PROCESSO DE CRIAÇÃO DE SUAS OBRAS

CINEMAGMA, 2000/2015.

Foto: Wilton Montenegro.

Essa obra foi criada em 2000 e tem referência direta com um trabalho realizado em 1997, chamado Condensador com sistema de lentes, no qual foi utilizado o resíduo têxtil, a estopa. O propósito de lentes seria uma pista que leva à ideia de imagens e de como elas se comportam e se desenvolvem. Adicionada à cor e à aleatoriedade de como esses elementos surgem, é uma colocação sobre como seria o desenvolvimento das imagens, sem que de fato você veja cada uma delas, como se elas fossem uma espécie de projeção de outro espaço. Sobre as possíveis relações com a pintura, interessa-me bastante o trânsito entre dimensões que, em um primeiro momento, não estariam próximas, sempre procurando outro tipo de observação, de descoberta. Uma descoberta que coincide com a invenção. É uma forma de trabalhar e pensar a invenção como um substrato muito potente.

Snooker. Foto: Divulgação.

MASS MEDIA PARA MODELAR, 2001-2015

MASS MEDIA PARA MODELAR (You Are such stuff as images are made on), 2001/2015 – FOTO Luis Asin.

Mass Media Para Modelar partiu de uma anotação minha em 2000. Ela foi realizada em Madri, na Arco, em um projeto chamado Project Room. Muitas peças surgem assim, a partir de pequenas anotações, simulações, maquetes… A massa de modelar está empregada tanto nas cadeiras quanto na pintura, são duas áreas distintas; em uma, a massa é manipulada e, na outra, não. Isso cria uma relação entre elas, um acontecimento que, em um primeiro momento, não nos permite entender o que se passa. Isso me interessa. Não existe qualquer lógica de composição na pintura na parede, o material é apenas manipulado, processado, cortado e adicionado na tela, sem qualquer a priori. Eu diria que, muitas vezes, eu não sei o porquê dos objetos que eu lanço mão. Depois, então, vou me dando conta. Em um primeiro momento, as coisas não têm uma justificativa, não são endereçadas, são a reunião de elementos que, por algum motivo, foram associados. Diante deles, há essa incerteza sobre qual o propósito do que está ali. Você não sabe qual é, eu também desconheço e, de alguma forma, busco torná-los presentes. O não saber faz parte do conhecimento. É um movimento para o olhar adormecido, um equilíbrio tênue.

OBSERVATION PLAN, 2003/2015.

OBSERVATION PLAN, 2003/2015 – FOTO Michal Raz-Russo

Essa obra foi produzida pela primeira vez em 2004 e apresentada em Chicago, e é um desenvolvimento direto da peça apresentada na Bienal de Pontevedra, na Espanha, no ano de 2000, chamada Nota sobre uma cena acesa ou os dez mil lápis que, inclusive, faz parte da coleção do MAM-SP e já foi apresentada algumas vezes em São Paulo. Creio que ela tenha uma série de relações a partir da perspectiva e uma espécie de foco que leva em consideração elementos insuspeitáveis para você atingir esse ponto. Ela vai, ao longo das montagens, produzindo uma sequência de imagens que vão contribuindo para esse foco também. O lápis produz, ao longo da peça, certa espessura com um devir, uma potência de possibilidades. Ainda que haja determinados princípios de silhuetas que devem ser seguidos na montagem, a cada vez, ela possui características próprias.

PARÁBOLA, 2000 – FOTO Wilton Montenegro.

Dentre muitas coisas, uma que me interessa bastante é trabalhar em uma escala intermediária, entre o que seria um modelo, uma maquete e uma escultura. A forma como Parábola se desenvolve lança mão de um recurso insuspeitável em relação à arquitetura, que é o nó. Eu já utilizei o mármore várias vezes, em muitas situações, mas sempre de forma a trazer algum elemento perturbador a alguma convenção ou categoria que seja. Alguns materiais trazem elementos que proporcionam uma dúvida que permanece. É a linguagem como possibilidade de investigar e questionar a natureza das coisas. Há uma inquietação que traz um questionamento do entorno e das circunstancias. É importante para mim o ponto em que se confundem o objeto em si e uma ideia e, igualmente, a relação entre eles. A reunião dessas obras no Santander Cultural é algo bastante inesperado, pela forma como elas se desenvolveram em vários momentos distintos. O que me surpreende são as relações e as circunstâncias entre si e como elas sempre estão se colocando novas.

JOSÉ DAMASCENO: MOTO-CONTÍNUO •
PINACOTECA DE SÃO PAULO •
24/4/2020 A 30/8/2021

 

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