A última vez que Sorolla expôs suas obras em Londres, nas Galerias Grafton em 1908, foi chamado de “o melhor pintor vivo do mundo”. Joaquín Sorolla e Bastida (1863-1923) nasceu e se formou em Valência, realizou estudos posteriores em Madri e no estrangeiro, e obteve o reconhecimento internacional com importantes pinturas de temática social. Sem embargo, foi o tratamento da luz em cenas cotidianas, os paisagistas e os costumes, assim como as dotes de retratista, que o levaram a consolidar a sua fama.
Como os grandes mestres espanhóis que ele tanto admirava, Diego Velázquez (1599-1660) e Francisco de Goya (1746-1828), Sorolla tinha um talento excepcional para a pintura. Sua capacidade de capturar vida e movimento, muitas vezes ao ar livre e em grande escala, continua a nos impressionar até hoje. Suas pinturas refletem os flashes da luz do sol na água, a tarde quente do calor escaldante e o ímpeto da brisa do mar.

Types from Salamanca,
1912 © Museo Sorolla, Madrid.
Tanto suas composições ousadas quanto os tons cromáticos cada vez mais acentuados sugerem que ele estava ciente das novas direções tomadas pela arte moderna. No entanto, como artista, ele sempre esteve comprometido com o naturalismo e representando a vida na Espanha em toda a sua complexidade.
A CASA DOS SOROLLA

María with Mantilla, 1910.
© Museo Sorolla, Madrid
Sorolla era um homem muito ligado à sua família, e sua esposa e filhos aparecem com frequência em suas obras. Em 1888, Sorolla se casou com Clotilde García del Castillo (1864-1929), filha de seu primeiro patrono. Clotilde, que sempre foi a modelo preferida do pintor, mal parece envelhecer ao longo dos anos. Os três filhos de Sorolla, María (n. 1890), Joaquín (n. 1892) e Elena (n. 1895), também aparecem em retratos variando de espontâneos a formais, como María com manta (1910), em uma referência clara a Goya: muitas dessas pinturas, incluindo o autorretrato de Sorolla, ele pintou em várias de suas casas em Madri. A última casa tinha uma oficina muito grande e um jardim frondoso com abundantes roseiras.
Em 1932, nove anos após a morte de Sorolla, a casa e a oficina foram abertas ao público. Hoje em dia, o Museu Sorolla é um Museu Nacional da Espanha.
TEMÁTICA ESPANHOLA: REPUTAÇÃO INTERNACIONAL

Another Marguerite!, 1892.
© Mildred Lane Kemper Art Museum, Washington
University in St. Louis.
Durante a década de 1890, quando a Espanha foi marcada pela agitação social e pela perda das colônias, Sorolla promoveu sua carreira com obras que davam conta da dura realidade de seu país. Em 1892, seu primeiro grande sucesso, Outra Margarita, que representa uma mulher presa por matar seu filho, ganhou elogios em Madri. A partir desse momento, Sorolla pretendia alcançar fama internacional enviando seus trabalhos para exposições em toda a Europa.
A proeza técnica de Sorolla e sua ousada denúncia social, com temas como a delinquência, exploração do trabalho e a devastação de doenças, atraíram a atenção do público. Seus trabalhos começaram a ganhar prêmios de prestígio: Costurando a vela (1896) ganhou medalhas em exposições em Paris, Munique e Viena, e sua monumental Triste herança (1899) recebeu um Grand Prix na Exposição Universal de Paris em 1900. Embora, depois de 1900, Sorolla tivesse se distanciado da questão da crítica social, essas pinturas tiveram um impacto perceptível sobre a próxima geração de pintores espanhóis, entre eles o jovem Pablo Picasso (1881-1973).

After the Bath, the Pink Robe, 1916.
© Museo Sorolla, Madrid.
FIEL À TRADIÇÃO ESPANHOLA
Neto de Velázquez, filho de Goya, foi o título do ensaio que o romancista Vicente Blasco Ibáñez publicou sobre Sorolla, em 1907.
Sorolla se viu dentro dessa tradição de artistas espanhóis que se destacaram por suas grandes habilidades de observação e habilidades técnicas.
Ele admirava especialmente Velázquez (1599-1660) e Goya (1746-1828), cujas obras ele estudou no Museu do Prado, em Madri. Em seus retratos, Sorolla costumava recorrer à gama característica de pretos, cinzas e marrons usados por seus antecessores, e também tentava alcançar a acuidade psicológica que tornara famosos esses artistas. Sorolla não foi o único que sentiu tal devoção pela tradição espanhola. Desde meados do século 19, as técnicas de pintura, o cromatismo e os temas de Velazquez e Goya estavam se associando à arte moderna internacional de artistas como Édouard Manet (1832-1883), John Singer Sargent (1856-1925) e James Abbot McNeill Whistler (1834-1903).

Skipping Rope, La Granja, 1907. © Museo Sorolla, Madrid.
A LUZ DO SOL E DO MAR
Nascido em Valência, Sorolla foi criado junto ao mar. A partir de 1900, ele produziu inúmeras obras pintadas ao ar livre, nas quais documentou as cenas de trabalho e lazer que testemunhou nas praias valencianas e mais ao sul, em Jávea. Essas pinturas venderam muito bem, especialmente nos Estados Unidos.
Aqui, grupos de crianças correm pela praia, a luz do sol dança no mar e as mulheres se ajudam a se despir à sombra das cabines. Crianças e bebês tomam banho, como sempre, enquanto meninas e mulheres usam vestidos longos. A atmosfera espontânea e despreocupada dessas obras não nos permite vislumbrar o intenso trabalho que as precedeu.
Sorolla costumava fazer esboços preparatórios e estudava esculturas clássicas antes de colocar seus modelos in situ. Em dias muito quentes, ele pintava sob grandes guarda-chuvas e fixava as lonas com cordas para que o vento não as derrubasse.

Young Fisherman, Valencia, 1904
© Photo: Laura Cohen.
VISÃO DE ESPANHA
Em 1908, uma importante retrospectiva da obra de Sorolla foi inaugurada nas galerias Grafton, em Londres. E, embora a exposição tenha opiniões divergentes, foi por meio dela que seu trabalho descobriu o que seria seu patrono mais importante: o filantropo e colecionador americano Archer Milton Huntington (1870-1955). Huntington, apaixonado pela arte e cultura espanhola, acabara de fundar a grande Sociedade Hispânica da América, em Nova York, para abrigar suas coleções. Em 1909, uma exposição da obra de Sorolla na Hispanic Society foi tão bem-sucedida que Huntington persuadiu o artista para decorar a biblioteca da instituição com uma série de murais de 70 metros de largura. Entitulada Visão de Espanha, essa obra pretendia documentar as tradições, comércios e roupas das diferentes regiões do país. Entre 1911 e 1919, Sorolla visitou a Espanha preparando e executando essa comissão.
Sorolla tinha o dom de encontrar o ponto de vista que melhor transmitisse a atmosfera e o caráter de um lugar
PAISAGENS E JARDINS
Sorolla tinha o dom de encontrar o ponto de vista que melhor transmitisse a atmosfera e o caráter de um lugar.
De uma panorâmica das áridas montanhas de Sierra Nevada brilhando à luz do pôr-do-sol para as torres medievais da Catedral de Burgos sob a neve, ele tentou capturar a Espanha em toda a sua diversidade sob variadas condições climáticas.

My Wife and Daughters in the Garden, 1910.© Fundación María
Cristina Masaveu Peterson, 2013. Foto: Marcos Morilla
Durante suas visitas ao sul, ele capturou a herança monumental do país a vista dos jardins do Alcazar de Sevilha e Alhambra, em Granada, brincando com a geometria desses espaços meticulosamente projetados e com os reflexos desconcertantes dos edifícios em suas fontes e piscinas.
Em San Sebastian, ele era fascinado pelo clima imprevisível e pela violência do mar, enquanto em Ibiza ele se concentrava nas falésias e no azul intenso de suas águas.
SOB A LUZ DO SOL
“Os pintores nunca conseguem captar a luz do sol como ela realmente é. Só posso me aproximar da realidade”, afirmou Joaquín Sorolla, em 1909, referindo-se a Monet.

Clotilde and Elena on the Rocks, Jávea, 1905
Archivo fotográfico BPS.
Um marco importante na carreira de Sorolla foi sua retrospectiva, em 1909, com 356 de seus trabalhos, organizados pela Sociedade Hispânica da América, em Nova York, um sucesso crítico e de público.
Ele conseguiu vender 195 obras em sua turnê com a exposição pelo país. Em Washington, o presidente Taft posou para um retrato que asseguraria a reputação internacional de Sorolla. O artista retornou à Espanha se transformando em um homem rico e com a perspectiva da generosa comissão que receberia pela Visão da Espanha. Muitas dessas pinturas ele pintou tanto no momento anterior quanto depois de alcançar seu grande triunfo nos Estados Unidos. Minha esposa e minhas filhas no jardim (1910) apresentam um tema que o ocuparia pelo resto de sua vida: a representação da família em telas monumentais, ao ar livre, como no próprio jardim de sua casa. Foi precisamente ali naquele jardim onde, em junho de 1920, ele sofreu um ataque de uma paralisia da metade do corpo que o deixaria incapaz de pintar. Sua condição de repente piorou e ele morreu cercado por sua família, em 10 de agosto de 1923.
Sorolla: Spanish Master of Light • The National Gallery • Londres • 18/3 a 7/7/2019