A exposição À Nordeste, em cartaz no SESC 24 de maio, de 16 de maio a 25 de agosto de 2019, surgiu como desejo de juntar as pesquisas de três curadores: Clarissa Diniz, Bitú Cassundé e Marcelo Campos. As pesquisas sobre e na região Nordeste já vinham sendo desenvolvidas pela curadoria em localidades distintas da região há, pelo menos, uma década. A partir disso, o projeto foi desenhado e tomou a pergunta do artista Yuri Firmeza, em texto de 2016, como mote: a nordeste de quê?
Partiu-se, então, para uma pesquisa que passou, em visitas da curadoria e da produção do projeto, por todos os nove Estados da região. O que poderia se tornar categórico e estigmatizado, como representação do Nordeste, transformou-se em potência do presente: obras e reflexões que fazem da região uma posição a ser desconstruída e não uma condição identitária e fixada por signos distintivos. Ao contrário, a exposição atravessa e é atravessada por mais de 150 artistas e por cerca de 300 obras que multiplicam e ressoam vozes, muitas vezes, silenciadas, subalternizadas e afixadas a um passado colonialista e rasamente turistificado.

Jonathas de Andrade, ABC da cana,2014. Foto: Eduardo Ortega.
A partir das viagens, trouxemos diálogos na tentativa de horizontalidade que não propõe distinção e diferença entre o status da arte moderna, contemporânea e popular. Além disso, são evidenciadas produções de design e internet, como memes, gifs, etc.
A exposição se divide em oito núcleos: futuro, (de)colonialidade, trabalho, linguagem, natureza, cidade, desejo, insurgência. Em cada um dos núcleos, encontram-se trabalhos que se relacionam com paradigmas históricos, como o êxodo de populações rurais para as cidades, trabalhadores nordestinos nos grandes centros urbanos ou em recrutamentos para a construção de projetos, como a transamazônica, ou ocupações de trabalhadores nordestinos em fábricas, casas de família, portarias.

Ana Lira, Letreiro Sentir Insurgente.
Assim, a pesquisa olhou o Nordeste no acirramento das questões eleitorais de 2018, que pintaram a região de encarnado. Assim, À Nordeste se situa nas encruzilhadas entre caminhos novos e ancestrais; respostas e reações aos estigmas e insurgências frente a assuntos aos quais não se pode calar.
O que se mostrou vivamente pulsante foi uma região que atua em questões políticas, artísticas e culturais se mantendo atenta a linguagens ampliadas da arte e às urgências de uma sociedade com traumas seculares, mas que se insurge frente ao desejo de uma politicagem excludente. Ao contrário do que se afirmou historicamente, estar a nordeste é tomar posição em relação ao que poderia tornar o Nordeste marginalizado. Tudo se lança ao futuro, as carrancas nas motocicletas, as radiolas do reggae, a vontade de transubstanciação, a existência de mundos oníricos. Um passado açucareiro e escravocrata é revisto, em certo amálgama entre religiosidade e protesto, sobrevivência de aldeamentos e aquilombamentos e a instauração do deboche e da alegria dos carnavais. A linguagem codifica outras geometrias, populares, processuais. Os caminhos do desejo se refazem em transes e propostas desde os limites da casa, dos quintais, à amplidão das paisagens. O advento das cidades deixa de ser privilégio do Centro-Sul e passa por críticas a ocupações contrastantes, como as casas de palafitas e os arranha-céus. Da natureza, retiram-se chás, lamas, mangues em que o contato e o convívio são amalgamados em tradições reinventadas por artistas.

Gê Viana, Daniel e Raimundo Mutirão.
À Nordeste, então, toma posição frente à norma vigente, desde seu título, com o uso de uma crase inexistente na norma culta da língua portuguesa, mas que acentua a ambiguidade entre estar localizado ou seguir em ampliadas derivações.
À Nordeste • Sesc 24 de Maio • São Paulo • 16/5 a 25/8/2019