Espelho do Poder, instalação inédita no Brasil, apresenta dois filmes centrais na produção da dupla dos artistas
Os artistas Bárbara Wagner & Benjamin de Burca são conhecidos por realizar filmes experimentais que investigam manifestações artísticas não hegemônicas. Concebidas como ambientes e instalações, suas obras em audiovisual sempre trazem a música como fio condutor das narrativas híbridas, que navegam pelos gêneros do documentário e da ficção, colocando em evidência práticas culturais, como o brega, o funk, o gospel, o hip-hop e o agitprop.
Elemento central de sua metodologia é a colaboração; em seus filmes, os protagonistas respondem por elaborar e reencenar suas próprias formas de representação diante da câmera. Essa abordagem colaborativa não apenas traz profundidade às suas narrativas, mas também questiona a relação tradicional entre artista e sujeito retratado, dissolvendo barreiras e ampliando o campo de representação cultural.
A MOSTRA
No Sesc Avenida Paulista (5º andar), com visitação até 3 de agosto de 2025, a mostra Espelho do Poder exibe os filmes como um espetáculo, no qual o público será conduzido pela voz da mestra de cerimônias Indra Haretrava, que comenta as obras da dupla, seus contextos e métodos. A mostra disponibiliza audiodescrição, legendagem e videolibras.
Com curadoria geral de Clarissa Diniz e curadoria de acessibilidade e coordenação do projeto educativo pelo coletivo alingua, a mostra parte de uma reflexão sobre as políticas do olhar e as práticas de espelhamento presentes em Swinguerra (2019) e One Hundred Steps (Cem Degraus, 2020).
Sobre o processo de colaboração na prática dos artistas a curadora comenta: “encarando a lente da câmera como espelho, reflexivamente, cada participante agencia sua própria recriação como personagem e integra a roteirização dos filmes em diálogo com Wagner & de Burca. Um método de trabalho que instiga trocas entre os artistas e as perspectivas poético-políticas que a criação coletiva dos filmes faz aproximar”.
Ainda acerca do movimento colaborativo, a equipe do coletivo alingua ressalta que seu procedimento envolve o reconhecimento das especificidades das exposições para o desenvolvimento de projetos de educativo e acessibilidade estética. Em ambos os casos, a proposta é ampliar os caminhos de comunicação dentro do contexto de cada exposição. Nesse processo, essas dimensões se entrelaçam, tornando difícil definir onde uma começa e a outra termina, como partes distintas de um só corpo.
A mostra conta ainda com direção de arte e projeto expográfico de Juliana Godoy, luz de Anna Turra, design do Estúdio Margem, música de Carlos Sá e dramaturgia de João Turchi.
AS OBRAS
Swinguerra (2019)
O trabalho foi desenvolvido em estreita colaboração com grupos de dança da periferia do Recife, acompanhando sua intensa rotina de ensaios para competições em torno de ritmos como a swingueira, o brega funk e o passinho.
Com a performatividade de traços provocativos e por vezes bélicos, esses gêneros musicais reinventam a resistência cultural e política das comunidades ao atualizarem suas memórias por meio do ritmo, da dança e da poesia.
One Hundred Steps (Cem Degraus, 2020)
O filme reencena visitas guiadas a casas-museus das elites inglesas e francesas, confrontando sua riqueza e poder por meio da presença dos corpos, das vozes e da musicalidade daqueles historicamente expropriados por essas elites. Dessa forma, profana a suposta sacralidade desses ambientes, onde a barbárie colonial se disfarçou de patrimônio cultural.
O trabalho faz referência à obra de Bob Quinn – cineasta irlandês cujas produções se dedicaram a desconstruir o imaginário eurocêntrico hegemônico e a aprofundar o papel que as culturas norte-africanas desempenharam na formação da cultura irlandesa.
OS ARTISTAS
Trabalhando em parceria há mais de uma década, Bárbara Wagner (Brasília, 1980) & Benjamin de Burca (Munique, 1975) vêm produzindo filmes e videoinstalações em diálogo com outros artistas e coletivos ligados ao som e à cena.
A dupla desenvolveu um método de pesquisa a partir da investigação e observação documental, construindo a direção, o roteiro, os figurinos e as trilhas sonoras em colaboração com os protagonistas de cada projeto. Essa maneira horizontal de trabalhar é crucial para veicular o conteúdo frequentemente urgente, social e historicamente determinado, da investigação audiovisual da dupla. Em suas abordagens do fazer artístico permanecem os tipos sociais e dinâmicas de atrito político como elementos formadores do discurso.
Wagner & de Burca participaram de bienais como o 33º Panorama de Arte Brasileira (2013) e 32ª Bienal de São Paulo (2016). Em 2017, participaram da decenial Skuptur Projekte (Münster, Alemanha) e do 20º Festival Sesc VideoBrasil. Em 2019, representaram o Brasil na 58ª Bienal de Veneza. Seus filmes já foram apresentados em diversas edições do Festival Internacional de Cinema de Berlim (67ª, 68ª, 69ª e 71ª Berlinale) e foram instalados em mostras individuais no New Museum (New York, USA) e MASP (São Paulo, Brasil).