Baseado nos diários de Lygia Clark, espetáculo teatral chega ao Rio de Janeiro

FOTOS: Kim Leekyung

Em setembro, o Centro Cultural Inclusartiz recebe uma nova temporada carioca do espetáculo “LYGIA”, baseado nos diários da artista mineira Lygia Clark (1920–1988). O monólogo, escrito por Maria Clara Mattos, conta com a atuação de Carolyna Aguiar. Bel Kutner assina a direção junto da autora neste profundo mergulho ao universo de Lygia Clark, dona de uma obra extremamente complexa, carregada de significados subterrâneos nem sempre explícitos, porém com uma estética direta, quase simples.

Indicada como melhor dramaturgia pelo Prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes) em 2022, “LYGIA” chega à Região Portuária do Rio de Janeiro pela primeira vez no dia 27 de setembro após estreia em 2019 na Zona Sul da cidade e temporada em 2022 em São Paulo. Esta iniciativa tem como objetivo democratizar o trabalho da artista e reforçar a sua relevância na atualidade, introduzindo novos públicos às suas práticas. Todas as apresentações do espetáculo contarão com tradução simultânea para Libras.

A dupla de diretoras têm esse subtexto como meta de encenação. Sim, encenação, é como preferem tratar o espetáculo. Sem o comprometimento do palco, sem a rigidez do teatro, sem o silêncio e a pura apreciação de uma exposição, buscando usar as linhas retas, as curvas e os objetos terapêuticos criados pela artista numa interação com o público. Ou seja, Lygia Clark na língua que ela buscou para suas manifestações artísticas: o corpo, a obra de arte e sua troca com a plateia. Mais do que um espetáculo, esta encenação é uma experiência estética, exatamente o que Lygia emprestou à própria obra: vida.

“O monólogo é um convite ao vasto mundo interior desta mulher. Seus sonhos, suas dores, suas alegrias. Não da artista plástica, não da terapeuta, mas da Lygia, pura e simplesmente. Alguém que fez dos próprios abismos o caminho de contato com o outro, alguém que acreditava que o potencial artístico humano estava no desvendamento dos próprios fantasmas”, conta Maria Clara Mattos.

Lygia Clark sempre buscou a interação entre o artista e o público. Da quebra da moldura, aos Bichos, à Estruturação do Self, o que esta mulher propôs – literalmente – foi a comunhão entre a arte e a vida. “Nossa intenção é experimentar ser essa artista que usou a própria angústia como material de pesquisa”, completa a autora.

Para Carolyna Aguiar, que interpreta Lygia, é de extrema importância termos a presença da artista no cenário atual. “Sua desconstrução do pensamento da obra de arte como mito, sua aproximação entre a vida e a arte, sua constante provocação sobre as fronteiras da experiência artística tiram o público da contemplação passiva.”, reforça.

No dia 28 de setembro, em paralelo à temporada de “LYGIA”, será aberta, também no Centro Cultural Inclusartiz, uma exposição homônima com caráter pedagógico, onde serão expostas réplicas de proposições da fase sensorial da produção da artista, acompanhadas de textos do renomado curador e crítico de arte Paulo Herkenhoff. No âmbito do espetáculo, também serão realizadas no espaço duas atividades educativas gratuitas baseadas em suas obras.

Na “Oficina Bichos” (30/09), Carolyna Aguiar se fundamenta na série Bichos (década de 1960) para trabalhar a partir das articulações do corpo e da coluna vertebral como eixo central. A iniciativa tem como foco jovens estudantes e interessados em dança, teatro e performance, entre 14 e 18 anos. Já a “Oficina Livro Obra” (03 a 07/10), será ministrada pela Associação Lygia Clark e voltada para crianças e pré-adolescentes (preferencialmente entre 8 e 14 anos). A atividade é um convite ao exercício da criatividade por meio da exploração de materiais cotidianos impulsionados pelas proposições do Livro Obra (1983).

A DRAMATURGIA, por Maria Clara Mattos

 

Lygia Clark sempre buscou a interação entre o artista e o público. Da quebra da moldura à saída da parede à Estruturação do Self, o que esta mulher à frente do seu tempo propôs – literalmente – foi a comunhão entre a arte e a vida. O monólogo “LYGIA” é um convite ao vasto mundo interior desta mulher. Seus sonhos, suas dores, suas alegrias. Não da artista plástica, não da terapeuta, mas da Lygia, pura e simplesmente. Alguém que fez dos próprios abismos o caminho de contato com o outro, alguém que acreditava que o potencial artístico humano estava no desvendamento dos próprios fantasmas.

De Caetano Veloso a Ivanilda Santos Leme, profissional do sexo e presidente da ONG Fio da Alma; de artistas consagrados a pessoas comuns, o que Lygia queria era o contato entre os corpos, encontros artísticos e curativos. Buscava, com seu estudo, provar que a arte era um sentimento, não um objeto de apreciação. Por tudo isso, em algum momento, o universo das artes plásticas deixou de ser capaz de classificar sua obra, apresentá-la e muito menos vendê-la. Sem o reconhecimento do universo terapêutico, que também não encontrou meios de enquadrar seu trabalho, Lygia começou só e terminou só. Talvez sem imaginar a importância que teria tantos anos depois de sua morte, talvez sem ter certeza de que faria parte da história artística do país, jamais desistiu de sua pesquisa artística e influenciou muita gente mundo afora.

Através de seus escritos e diários, nossa intenção é experimentar ser essa artista que usou a própria angústia como material de pesquisa. Angústia, material tão comum aos seres humanos quanto os sacos de laranja e de cebola, as pedras e os sacos plásticos, as luvas e as tesouras, o barbante e a baba, matérias-primas da vida banal como caminho de tradução da alma artística de cada um de nós. Pela arte de criar. Lygia foi experimentação estética do começo ao fim. Ao ser encontrada morta, sentada na poltrona, vestida e penteada diante de uma televisão desligada, como fazia todos os dias, uma pergunta se impôs naturalmente: até na morte ela foi obra de arte? Cremos que sim. Evoé!

A EXPOSIÇÃO

Além da instalação cenográfica, também estarão expostas réplicas das principais proposições da fase sensorial da obra de Lygia Clark, acompanhadas de textos do renomado curador e crítico de arte Paulo Herkenhoff. A ideia é incentivar, por meio de uma proposta pedagógica, a interação do público com os objetos/obras tendo a própria experimentação como vivência estética. A arte que extrapola as paredes das galerias e atira-se em direção ao corpo do outro. Sendo o outro incentivado a abandonar uma postura passiva de contemplação pré-formatada para uma interação livre, propositiva, tangível e profunda.

Compartilhar:
Notícias - 04/07/2024

Busto de bronze de imperador romano é encontrado após 200 anos

Um busto de bronze do imperador romano Calígula foi encontrado 200 anos depois de seu desaparecimento — e 2.000 anos …

Notícias - 04/07/2024

Banksy faz performance sobre imigrantes em festival e é duramente criticado

O secretário do Interior britânico, James Cleverly, classificou a obra de arte do barco de migrantes de Banksy como “vil”, …

Notícias - 04/07/2024

€ 500 milhões? Este seria o valor para mudar Mona Lisa de sala no Louvre

O mundo da arte ficou agitado quando surgiram relatos em abril de que a Mona Lisa está sendo realocada para …

Notícias - 04/07/2024

Item do universo Harry Potter se torna o mais caro vendido em leilão

A pintura original em aquarela que mais tarde foi usada como capa do primeiro livro “Harry Potter” quebrou um recorde …

Notícias - 03/07/2024

Seria este o primeiro retrato encomendado de uma americana nascida na escravidão?

Há pouco mais de uma década, Dorita Sewell, da Flórida, e sua falecida mãe Doris receberam uma pintura de um …

Notícias - 03/07/2024

Arqueólogos encontram oficina da Idade do Bronze que produzia tinta valiosa do mundo antigo

Embora pequena, a ilha de Egina, no Golfo Sarónico, na Grécia, ostenta uma rica pegada histórica que remonta a milênios. …

Notícias - 03/07/2024

exposição traz fotografias de José Hamilton Ribeiro na Guerra do Vietnã

No dia 10 de julho, o MIS, instituição da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São …

Notícias - 03/07/2024

Top 10 lotes mais caros vendidos em leilão no mês maio de 2024

A lista das 10 obras de arte mais caras vendidas em leilão em maio ficou completa em meados do mês, …

Notícias - 03/07/2024

Conheça viral do tik tok onde alunos de arte tem seus portfolios avaliados pelos público

Milhares de estudantes do ensino médio nos Estados Unidos enviaram seus portfólios de cursos de Arte e Design de Colocação …

Notícias - 02/07/2024

Artista esmaga carro de Elon Musk com uma escultura de pedra

O escultor Chavis Mármol deixou cair uma réplica de nove toneladas de uma cabeça olmeca no teto de um Tesla …

Notícias - 02/07/2024

Prêmio AF de Arte Contemporânea 2024 finalistas

O Prêmio AF de Arte Contemporânea 2024 acaba de divulgar as três finalistas da edição comemorativa de 10 anos: Camila …

Notícias - 02/07/2024

Colecionador abre museu voltado a artistas mulheres na Europa

O melhor de ter o seu próprio museu é “andar por ele sem que ninguém saiba quem você é, ouvindo …