“Imagine um homem acelerando por uma estrada. Seu Tesla avisa que está com pouca energia, então ele para em uma estação de recarga. Com sede, pega um energético Monster e o bebe rapidamente. Enquanto espera, confere sua carteira de criptomoedas para ver como estão seus ‘memecoins’. É hora de aplicar um golpe? Ainda não. Ele volta para o carro e coloca o último episódio do podcast de seu comediante favorito. Ele está com pressa. Para onde ele está indo? Pode ser para qualquer lugar. A galeria Eden Fine Art no Wynn, em Las Vegas, para a abertura de uma exposição de Alec Monopoly. A festa Wynwood Walls x Joopiter patrocinada pela Uniqlo durante a Art Basel Miami Beach. A abertura da exposição da MSCHF na Perrotin, no Lower East Side de Manhattan. Onde quer que ele esteja, ele irá postar uma foto no X. Ele é um colecionador de arte ‘red-chip’, e está ganhando cada vez mais espaço no mundo da arte.”
Esta fábula contemporânea foi criada por Annie Armstrong, colunista do site Artnet, para ajudar a explicar o que é arte “red chip”.
Estamos acostumados a ouvir a expressão “blue-chip” para designar artistas consagrados, valorizados pelo mercado e pelas instituições tradicionais de arte. No entanto, um novo termo vem ganhando espaço: a arte “red-chip”. Diferente da primeira, ela se caracteriza por um apelo mais popular, voltado para colecionadores emergentes e um público digitalmente engajado.
A arte “red-chip” não segue os padrões tradicionais de valorização artística. Em vez de estar ligada a museus e colecionadores clássicos, sua força vem do mercado contemporâneo, onde redes sociais, cultura pop e o universo cripto exercem forte influência. Entre seus traços visuais recorrentes, estão a estética do grafite, elementos de design superflat e materiais brilhantes, como o cromo colorido. Muitas vezes, está associada a edições limitadas, NFTs e colaborações com marcas de moda.
Segundo Armstrong, um aspecto essencial da arte “red-chip” é sua independência em relação à história da arte tradicional. Seus criadores não necessariamente buscam reconhecimento de especialistas ou instituições, mas sim a adesão de um público que valoriza a exclusividade e a capacidade de gerar impacto visual, especialmente nas plataformas digitais. Dessa forma, artistas como Alec Monopoly, Mr. Brainwash e Romero Britto conquistaram notoriedade, mesmo sem o respaldo do circuito de galerias mais tradicionais.
Além disso, alguns artistas que transitam entre o mercado tradicional e o universo “red-chip” conseguiram consolidar um espaço híbrido. Nomes como KAWS, George Condo e Virgil Abloh se destacam por unir elementos da cultura urbana ao universo das artes visuais, atraindo tanto colecionadores tradicionais quanto um público mais jovem e conectado. Colaborações com grandes marcas, como Louis Vuitton e Supreme, reforçam essa fusão entre arte, moda e consumo.
A ascensão da arte “red-chip” foi impulsionada pelo mercado de criptoativos e pela cultura do colecionismo digital. O caso do artista Beeple, que vendeu um NFT por US$ 69 milhões em 2021, evidenciou o poder desse novo modelo de valorização artística. Mais do que uma tendência passageira, a arte “red-chip” demonstra que o conceito de valor na arte está se transformando, com cada vez mais influência da internet e da cultura contemporânea.
O auge da arte “red-chip” pode ser exemplificado por Mark Zuckerberg encomendando a Daniel Arsham uma escultura de sua esposa em azul Tiffany. Ou pelo leilão da obra “Comedian” (2019) de Maurizio Cattelan, com uma banana sendo vendida por US$ 6,2 milhões e, posteriormente, comida por um milionário cripto como parte da performance.
Ainda que museus e galerias de renome hesitem em aderir totalmente a esse movimento, o mercado não parece depender deles para crescer. O interesse do público por esse tipo de arte continua aumentando, e a questão que fica é: até que ponto o mundo da arte tradicional será capaz de resistir a essa mudança de paradigma?