Por Fabrício Reiner
…é uma impressão em que a alma talvez tenha uma parte maior do que os sentidos, de amplitude e liberdade, de grandiosidade e infinito, derivada do comprimento horizontal das linhas do terreno, onde parece quase que cada característica de verticalidade seja diluída no panorama; poucas paisagens […] querem ser mais sentidas do que, por assim dizer, visualmente admiradas…
[adaptado de “La scuola, la Calabria, il Mezzogiorno” – Laterza, Bari – 1985 ]
O Parque – Renina Katz
O ano de 1956 é emblemático na trajetória de Renina Katz, não apenas porque marca o início de sua atuação contundente e irrepreensível como professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, mas principalmente porque representa um ponto de inflexão determinante na sua prolífica atividade artística.
“Foi a partir dessa época que comecei a me preocupar cada vez mais com problemas de ordem formal, me dando conta de que o tema era puro apoio. Em 1956 fiz minha última gravura, o Parque, de madeira. Daí em diante comecei a fazer aquarela, pintura etc. Comecei uma revisão do meu próprio trabalho por perceber que estava preocupada com a elaboração, com recursos filigranados da gravura.”
Evidentemente que qualquer esforço de datação nesse sentido se sujeita à imprecisão, principalmente porque a fonte consultada baseia afirmações na memória da artista que, como se sabe, opera como narrativa que se sujeita a uma percepção construtiva do ser. De todo modo, o fato é que aqueles anos de 1950 assistiram a uma mudança significativa na percepção que Renina fazia tanto do panorama da arte no Brasil quanto, principalmente, do seu próprio fazer artístico. Reconhecida, naquela época, por um trabalho xilográfico em que a temática social prevalecia, a artista militava, de forma aguerrida, nos debates políticos que se travavam no país e agia, pungente, na controvérsia que se abriu em fins de 1940 em relação à arte abstrata.
A querela entre as vertentes da arte figurativa em contraposição as da arte abstrata, no Brasil, foi das mais prolíficas e ostensivas, gerando tanto uma profusão de pensamentos, opiniões e obras quanto um conflito aberto, que chegou às vias de fato. Não obstante, a disputa demonstraria ser mais um reflexo da luta que um grupo de artistas travava contra o que acreditava ser um afluxo desmedido de informações externas (e que incidia inclusive na tentativa de implantação das bienais) , prejudiciais para o meio artístico brasileiro, o qual ainda buscava a individualização de uma arte nacional.
O ideal estético do assim chamado realismo social, grosso modo, e guardada as devidas dissidências próprias a qualquer generalização, consistia na tradução da realidade através do temperamento artístico. Naquela acepção, acreditavam seus cultores, o homem retratado era o homem real, imerso nos embates de sua época, transformado internamente pelas relações sociais, compelido a moldar sua consciência individual em conjunção ou oposição à ordem estabelecida . No Brasil, o movimento ganhou relevância no decênio de 1930 com artistas que se dedicaram a tratar tanto dos trabalhadores quanto de sua condição de vida depauperada, denunciando, assim, injustiças sociais. A arte passou a ser vista como uma forma de comunicação poderosa em um mundo convulsionado pela guerra e pelas disputas político-sociais e tencionava provocar reflexões sobre a condição humana e as estruturas de poder vigentes. O objetivo era o de engajar o espectador (a classe trabalhadora) em um processo de crítica e transformação social.
De Livio Abramo a Carlos Scliar, passando ainda por Poty Lazzarotto e Vasco Prado, Portinari e Di Cavalcanti, a arte social se consolidou, mesmo que em diferentes vertentes; tanto, que entrou justamente em disputa. Não por acaso se atribui à conferência de Di Cavalcanti, pronunciada em 1948 no Masp e publicada na revista Fundamentos , o motivo da incitação à controvérsia. Se ao comparte da semana de 22 coube, naquele momento, tanto uma crítica ao caráter elitista da semana (que se deixe bem claro) quanto à abstenção do artista na vida social de seu povo, compatibiliza-se a denúncia desse mesmo elitismo verificado agora na opção dos museus recém-inaugurados pelo abstracionismo.
Di Cavalcanti afirmava que “hoje, quando se proclama como arte do nosso tempo o abstracionismo, o surrealismo ou todos os outros cacoetes metafísicos do anarquismo modernista, caminha-se numa rua estreita, só agradável para aqueles refinados que amam a podridão” e dicotomiza, posteriormente, em entrevista a Ibiapaba Martins, que ao artista se colocam apenas duas opções: “o caminho estreito da pintura formalista, preciosa, fim-de-século: o decorativismo abstracionista ou um primitivismo piegas” e a “pintura a serviço da vida, isto é, participando do drama atual da nossa existência, participando da construção cotidiana de nosso futuro e nação livre.”
Diante das alternativas, mas certamente não em função do direcionamento do modernista, Renina opta, naqueles anos, por uma arte engajada. E é curioso que a historiografia estabeleça os anos 1948 e 1956 como os de sua prática política na arte, talvez por força de uma orientação conduzida pela própria artista, talvez por uma imposição do mercado de arte da época. Ainda que se saiba que a arte de cunho social tenha sido adotada pela Renina estudante do gravador Axl Leskoschek, alguns anos anteriores a 1948, a força do marco simbólico extravasa a figura da gravadora para se inscrever em movimentos históricos mais amplos, que têm início em 1948, com a fundação do MAM-SP e consequente conferência acima citada de Di, e encerramento em 1956, com o XX Congresso do Partido Comunista, marcado pelo discurso de Nikita Khrushchov e que denunciava as violências impostas pelo regime stalinista. Esse discurso teve impacto não somente na percepção que Renina fazia do regime soviético, e sua consequente desilusão, como também pesou de maneira decisiva a balança da disputa artística no Brasil em favor da arte abstrata.
“Por essa época não estávamos mais seguros de que fosse através da linha até então mantida que pudéssemos influir. […] comecei a me questionar do seguinte modo: ‘sou uma artista, de origem burguesa, formação de Escola de Belas Artes, que por circunstâncias várias, morando no pós-guerra no Rio de Janeiro, centro de grande efervescência, movimento estudantil etc. criei uma postura ideológica e quis levar essa postura ideológica para dentro do meu processo artístico. E confundi certas áreas. De repente, me senti querendo mostrar ao povo uma sua imagem. […] E quando ele recusa esse tipo de visão, percebo que estou impondo a ele uma visão de má consciência burguesa e querendo que ele me dê o endosso e o aval para isso. Não me deram. Não deram porque eles não têm nada a ver com isso. É uma coisa espontânea. […] não tem nada a ver, posto que não é daquele jeito que eles acham que são. Em consequência, era ainda toda uma postura de classe, de cima para baixo, não era nem sequer uma proletarização, não era nada. […] Mas em meu caso, eu achar que minha gravura tinha a linguagem adequada para ser absorvida e até ser uma bandeira do que eu chamava ‘povo’ era de uma pretensão juvenil totalmente absurda. Eles poderiam ter até uma empatia pelo meu trabalho, mas eu não podia falar em nome deles. […] Porque havia por baixo daquilo tudo, um discurso literário.”
É curioso notar que a fala de Renina em 1980, retroagindo os motivos que a fizeram abandonar a arte figurativa e engajada por uma preocupação mais de ordem formal, reflete, de certo modo, as considerações de Mário Pedrosa. Para o crítico, na fase inicial de sua produção, que se registra no início dos anos de 1930, a ideia de “arte revolucionária” possuía uma forte conotação de envolvimento político, ação social e discurso que visava promover a conscientização das massas. Posteriormente, essa concepção passaria a abranger outros significados, incluindo a renovação constante e atualizada dos meios formais e de expressão . Nesse contexto, durante a primeira fase da produção crítica de Mário Pedrosa, a noção de “arte revolucionária” estava intrinsecamente ligada às lutas sociais propriamente ditas e à contínua atualização e desenvolvimento da consciência política. Para ele, assim como para a artista Renina Katz, a arte era um dos meios mais eficazes de militância política.
Vale ressaltar que a percepção da arte como um caminho privilegiado para o engajamento político e a conscientização social também evoluiu dinamicamente no pensamento de Mário Pedrosa. Essa perspectiva se fundamentava no que ele acreditava ser o estímulo da arte brasileira a superar seus resquícios conservadores e alinhar-se com a arte mais vanguardista de seu tempo. Exemplo disso, pode ser verificado em texto publicado no Jornal do Brasil, em que Pedrosa responde uma crítica feita por Rubem Braga sobre exposição de Maria Bonomi, em 1959. Nela, a abstração é entendida como traço essencial da contemporaneidade, atributo da sensibilidade e expressividade artística, situando o abstracionismo em um campo distinto do que entendia ser as coerções do realismo soviético . Em outro texto, anterior, “Arte e revolução” (1952), Mário Pedrosa comenta outro argumento também abordado por Renina, no que se refere à indiferença do público em relação aos trabalhos de arte. E declara: “o que interessa às massas é o cinema, o futebol, o boxe, o circo, o teatro chulo ou vaudevillesco, o carnaval. O grande móvel delas é divertir-se. Elas são absolutamente indiferentes, tanto à boa pintura figurativa como à abstrata.”
Ora, evidentemente que os acontecimentos sociais e políticos daquele período, somados a um ambiente artístico que privilegiava o abstracionismo como último estágio do desenvolvimento artístico, tiveram impacto decisivo na opção de Renina em abandonar seja a figuração engajada seja a gravura em madeira, mesmo após o lançamento de seu do álbum “Favela” em 1956, com o qual a artista alcançava ainda mais reconhecimento.
Entretanto, essa passagem do figurativo ao abstrato não se deu em Renina Katz de maneira tão abrupta quanto possa parecer e O Parque é exemplo simbólico, embora não seja único. Não apenas porque se trata de sua última xilogravura, mas por condensar vários dos elementos estruturantes que demonstram as razões de Renina ser uma das maiores artistas brasileiras, mesmo que nossas preferências artísticas contemporâneas tenham-na desdenhado.
A xilogravura em questão começava com o corte longitudinal da prancha, caracterizando quatro planos que sugerem a profundidade na paisagem. Com a goiva, a artista escavava as grandes áreas brancas para deixar em relevo os traços que constituíam uma profusão de figuras, as quais apareciam a medida em que a artista perscrutava. Aprofundando os buris, detalhava essas figuras que, diferentemente de outras suas xilogravuras, afastavam-se tanto dos antigos ornamentos de madeira, de execução rígida e esquemática, quanto da sugestão do claro-escuro. A suavidade dos meios-tons também é abandonada, mas não a robustez do traço, cuja perfeição maravilhosa ainda impressiona.
A sensação é a de que a imagem gravada na madeira foi transferida por meio de uma película fotográfica, ainda que essa impressão se desfaça à medida que se evidencia a esquematização da substância da composição, mas não seu detalhamento. A artista, muito provavelmente, realizou o trabalho manual de gravação observando o campo de ação do buril através de uma lente de aumento, dada a minúcia da imagem. E por fim, mas não por último, salienta-se as “árvores” que individualizam cinco planos verticais e que pormenorizam cenas distintas, singularizando os elementos em questão.
Com efeito, pode-se dizer que a obra seja essencialmente linha. A qual configura dimensões espaciais articuladas e cuja extensão linear, modulada, cria sequências que atuam na gravura de modo a direcionar tanto a composição quanto nosso olhar. Cada segmento linear, sendo ele contínuo ou interrompido, realça uma dimensão de espaço e reforça o peso visual da linha, criando assim uma dimensão ilusória, quase onírica, que tanto fascina o observador. E, mesmo que essa sensação seja mais resultado de aprimoramento técnico e conceitual de uma artista que atingiu a excelência na sua arte, esta não se sujeita a tecnicismos. Isso porque Renina nos propõe, subjacente, um seu questionamento que incide tanto sobre seu fazer artístico quanto sobre o tempo, seja ele o da arte ou o do dia-a-dia (e consequentemente o que fazer com ele dali em diante). Há uma sensação de suspensão temporal; uma melancolia que se agarra à alegria já esvanecida, ainda que conforte a angustiante apreensão diante do desconhecido, que já se faz presente. No parque de Renina os elementos se alinham e se unem para propor uma ideia de tempo formado por multiplicidades distintas, as quais apresentam uma concepção de temporalidade abstrata, produzida por meio de uma sucessão temporal que envolve o estabelecimento de intervalos e a fixação de contornos dos objetos. Ou seja, cada figura pode ser comparada a um estado de consciência e, por isso mesmo, ocupa lugar no espaço. Nesse espaço ideal, onde supomos alinhados todos os acontecimentos, dada a profusão, é possível que operemos realinhamentos temporais infinitos. O que também significa que cada reordenação psíquica desse tempo da gravura anularia o tempo em si, dada que a linha, em última instância, não existe no espaço natural, assim como o tempo; ambos nascem da abstração.
Desse modo, é possível inferir que a estrutura formal dada à xilogravura Parque talvez seja a única maneira possível de materializar a experiência subjetiva que Renina atravessava naqueles anos. Mesmo que seus pensamentos e emoções jamais sejam atingidos, uma vez que se individualizam, por natureza, subjetivos, a forma resultante conseguiu capturar e transmitir, de alguma maneira, essa experiência pessoal. E quando observamos a gravura, também nós atuamos intuitivamente ao realizarmos essa síntese. Há nesse parque um depoimento pessoal muito incisivo, no qual a artista eleva o tema a uma condição para além de si mesma. E o preto e branco é significativo nesse pensamento. Uma vez que o sentimento interior da artista contrasta com o que é externo: o preto contra o branco.
Na gravura, ambos têm o poder de gerar uma tensão imediata; se o branco contém todas as cores, e remete à ideia de fusão e união luminosa, o preto, por outro lado, é uma ausência de cor, portanto, a escuridão. O branco e suas sombras conferem um movimento sinuoso, quase como uma respiração, fazendo com que o observador perceba uma certa instabilidade, aquela que depois se manifestará na sobreposição das figuras humanas pelas da natureza, no caso as “árvores”, cuja ramificação condiciona toda composição.
“Seu caráter dominante reside na extração e não na adição de matéria, subvertendo portanto a atitude do artista: os espaços emergem de dentro para fora. O sulco e o relevo geram assim valores de luz e sombra e zonas intermediárias em que o preto e o branco não significam cheio e vazio” Texto de Renina Katz e Maria Bonomi. (1977-80).
Não por acaso o álbum da artista “Antologia Gráfica”, publicado, em 1977, pelo editor Julio Pacello, vinte anos após o período da contenda sobre a abstração e que coincide temporalmente com a declaração acima, contempla gravuras, de madeira e linóleo, realizadas nas balizas dos anos de 1948-1956. Dividido em dois volumes, trazia um conjunto de 24 gravuras cuidadosamente impressas em papel japonês, em uma edição numerada de apenas 80 exemplares, mais 10 exemplares especiais. O álbum, por mais que acenasse ao colecionismo e à solidificação do nome da artista no mercado de arte daquele momento, mostrava-se um mergulho profundo na trajetória artística de Renina Katz e era especialmente significativo por se tratar do último editado por Pacello, que morrera alguns meses antes.
Não obstante, a edição desse álbum concorre com a realização da série “Cárceres”, composta por litografias cujos vestígios da figuração cedem espaço para composições abstratizantes, ainda que conserve, em alguns casos, a figura enquanto signo. Linhas horizontais e verticais sugerem as grades que identificam o título e encerram paisagens imaginárias, anônimos e pássaros. O vermelho, atua também como representação sígnica e alude ao sangue que escorre sobre o preto e o branco. Essas litografias, feitas no período mais sombrio da história recente brasileira, retomam o discurso social dos anos de 1950. A aposta, agora, não é mais o apelo ao engajamento político, mas ao olhar. Os bruscos contrastes em preto e branco somados à insustentável vibração das cores complementares, o cintilante entrelaçamento de linhas e as estruturas permutadas são todos elementos cujo propósito não é mais imergir o observador no reconhecimento de uma situação de desigualdade latente, mas antes estimulá-lo através do olhar. O preto e branco, neste caso, não é um artifício e serve para reforçar o complexo processo lógico que está na base da abstração de Renina.
“Por volta de 1956 comecei a perceber que o tema, o assunto, estava me tornando refém. Era preciso romper com a inércia, ampliar o repertório, o imaginário. A música foi meu grande apoio. Qual é o tema da música, a não ser ela própria. A história revela que a música se enriqueceu a partir da invenção de novos instrumentos que ofereciam múltiplas articulações dos sons a serviço da audácia e do talento dos autores. Por que não tentar o mesmo com a visualidade? Fiquei tão tomada com esta meta, que passei a não dar título aos trabalhos, de modo que o espectador ficaria igualmente livre na sua relação com a obra. Comecei com “Paisagem”. O que significa uma paisagem? Turner me deu a lição. Daí para frente meu propósito seria o aperfeiçoamento não só do fazer, como da minha subjetividade. A representação e organização do espaço plástico, o conhecimento dos elementos que vão dar materialidade à obra passaram a ser a meta do meu trabalho. Nesta altura do meu percurso, eu queria ter o domínio dos meios, do ofício, pois sem ele não teria a liberdade desejada. É livre quem conhece, quem sabe.”
De fato, Renina continuou a alcançar a excelência artística mesmo após 1956, demonstrando a qualidade constante de seu trabalho, ainda que em suportes diferentes. Sua habilidade em transformar a subjetividade em formas visuais concretas prevaleceram sobretudo pela sua maestria técnica e expressiva. E, nesse contexto, a retomada de suas xilogravuras no álbum “Antologia Gráfica”, de 1977, pode ter contribuído de modo decisivo para a produção sequente da artista. Este processo, como se sabe, em que a imagem é criada por meio da eliminação de material, cortando-se tudo ao redor das linhas e formas que serão impressas, é um testemunho indiscutível de habilidade técnica, dada a complexidade do processo. Paralelamente, na xilogravura, as áreas em relevo recebem a tinta de impressão, geralmente aplicada com um rolo, embora, dependendo do tipo de tinta, possam ser utilizados também a boneca de couro, a escova e o pincel. Após a aplicação da tinta na matriz, o papel é colocado sobre ela e pressionado no verso. Esta operação é delicada, pois a intensidade da pressão deve ser controlada para evitar que o papel rasgue, ao mesmo tempo em que deve ser suficiente para que a imagem seja fixada com nitidez. Todo esse processo exige um controle absoluto de todas as etapas a fim de que a mensagem possa ser levada ao papel exatamente como se antecipou. E, dada essa complexidade, é fácil se perder em tecnicalidades.
Possivelmente para a artista tenha sido essa tecnicalidade que a fizera se afastar da xilogravura e da temática a ela associada, como sugerem suas entrevistas e a crítica da época.
“Em agosto de 1956, suas xilogravuras ‘de forte conteúdo’ social, apresentadas na 28ª Bienal de Veneza, alcançaram um bom sucesso de vendas. Mas quando expôs em São Paulo, em outubro desse mesmo ano, alguém nota que, ao lado de temas sociais, aparecem árvores sem folhas, um Domingo no Ibirapuera; na verdade a artista começa a se interessar por outras coisas: em 1958, na Galeria GEA do Rio, vê-se que ela abandonou a gravura, em que se aperfeiçoara durante tantos anos, para fazer nanquins e guaches.”
O amigo Flávio Motta recupera a passagem de Rubem Braga, sem, contudo, recorrer ao julgamento que a acompanhou pelos anos posteriores em que abandonou a xilogravura. No texto de apresentação do álbum, escrito pelo crítico amigo, cinco anos antes de sua publicação, lê-se: “quando deixou as figuras de seu ‘realismo socialista’ e passou para as árvores e casas, o sentido de multiplicação parecia modular seus interesses fundamentais. A partir de cada tronco, tudo se bifurcava. A partir de cada casa, tudo se desdobrava. Alguma coisa de obsessivo, repetitivo, parecia comandar o processo da ‘natureza’, vista nas árvores, e da sociedade, vista nas casas .
E se o simbolismo do escrito de Motta influencia a nossa interpretação não só do parque de Renina, mas de sua obra como um todo, espera-se que o esforço da artista, impresso em cada traço, continue a pulsar através do tempo, ressoando sutileza e profundidade; testemunho de sua busca incansável pela transformação.
Depoimento de Renina Katz à Aracy Amaral. São Paulo, 19 jun. 1980. In. Arte para quê. A preocupação social na arte brasileira 1930-1970. São Paulo, Nobel, 1984.
Idem. p. 268.
Idem. p. 230.
AGOSTI, Hector. “Defesa do realismo”. Joaquim, Curitiba, (21), 1948.
DI CAVALCANTI, Emiliano. “Realismo e abstracionismo”. Fundamentos, São Paulo, ago. 1948. p. 241-6.
Em 1948 o MAM-SP era fundado e a opção do museu pela arte abstrata se fazia presente já na sua primeira exposição “Entre o figurativismo e o abstracionismo”, conduzida pelo crítico francês e diretor do museu, Léon Dégand.
DI CAVALCANTI, Emiliano. “Realismo e abstracionismo”. Fundamentos, São Paulo, ago. 1948. p. 241-6.
MARTINS, Ibiapaba. “Di Cavalcanti investe contra os mitos do falso modernismo”. Última Hora, São Paulo, 23 jun. 1952.
OVIDIO, João Paulo Brito dos Santos. Antologia gráfica, antologia crítica: os discursos críticos sobre as gravuras de temáticas sociais de Renina Katz (1948/1956). Trabalho de conclusão de curso apresentado à Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2019.
Depoimento de Renina Katz à Aracy Amaral. São Paulo, 19 jun. 1980. In. Arte para quê. A preocupação social na arte brasileira 1930-1970. São Paulo, Nobel, 1984.
BARROS, José D’Assunção. “Mario Pedrosa e a crítica de arte no Brasil”. ARS, São Paulo, 6 (11), 2008.
PEDROSA, Mário. “Por moda?. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 20 jun. 1959.”
LAUDANNA, Mayra (org.). Maria Bonomi: da gravura à arte pública. São Paulo, Edusp/Imprensa Oficial, 2007. p. 317.
PEDROSA, Mário. “Arte e revolução”. In. Mundo, homem, arte em crise. São Paulo, Perspectiva, 1975, p. 246.
BONOMI, Maria e KATZ, Renina. Texto sobre gravura feito para o Panorama de Artes Gráficas do MAM-SP, 1977-80. Não publicado.
Depoimento a Gloria Cristina Motta. São Paulo, 14 jun. 2007.
BRAGA, Rubem, Árvores tristes. In. SEFFRIN, André (org.). Os segredos todos de Djanira & outras crônicas sobre arte e artistas. Belo Horizonte, Autêntica Editora, 2016.
MOTTA, Flávio. Sem Título. In: Antologia Gráfica. São Paulo, Ed. Julio Pacello, 1977.