No próximo dia 4 de novembro Referência Galeria de Arte, o artista plástico Ralph Gehre apresenta uma mostra individual com obras produzidas entre 2015 e 2023. Esta é sua primeira individual na galeria desde 2019. O artista traz para a sala de exposição questionamentos sobre os papéis dos agentes da arte na contemporaneidade por meio de sua produção pensada sempre a partir da pintura, seja ela tradicional ou experimental.
Desde sua primeira individual na Referência Galeria de Arte em 1999, Ralph Gehre já realizou sete exposições próprias na galeria e participou de incontáveis mostras coletivas e de acervo. “A relação com a galeria, no entanto, remonta a meados dos anos 1990, quando fomos apresentados por intermédio de uma curadora. Desde então, nossa relação é profissional quando tem que ser e de amizade, o tempo todo”, diz a galerista Onice Moraes. “Ralph é um artista que observa cuidadosamente o mundo que o cerca para então responder com argumentos consistentes e muita coragem. A exposição, sem título nem curadoria, traz ao público um recorte da produção de Ralph Gehre, sendo que os trabalhos mais antigos datam de 2015 e os mais novos, de 2023. Neles, podemos ver a produção de um artista plástico que pensa sua produção e – como ele costuma ressaltar – a partir de um pensamento pictórico, as fronteiras e os limites da pintura e de materiais que assumem às vezes do lugar da tinta, mas também da tela como suporte, sempre em função do pensamento pictórico do artista”, ressalta a galerista.
Ao se abster de título e curadoria, Ralph deixa ao público a responsabilidade pela leitura das obras e a necessária crítica ao trabalho dele como artista plástico. Ele comenta que em sua poesia, a norte-americana Louise Glück observa “a coisa cintilando entre as pedras”. “Faz pensar em um rio correndo sobre seixos em leito raso, deixando ver algo que temos dificuldade de distinguir. Talvez seja o reflexo inquieto da luz do dia sobre a superfície da água ou apenas um caco de vidro perdido no fundo, mas há a possibilidade de que seja uma pedra preciosa. Suponho referir-se a seu processo de construção literária, mas como em sua escrita persiste a figura de um artista pintor, ouso tomar essa “coisa” para pensar meu processo na pintura. Vez por outra consigo avistar em meu trabalho uma qualidade que me alegra, mas não é sentimento sólido, constante”, diz o artista.
E segue: “Sigo fazendo pintura, tentando esvaziá-la de subterfúgios, recusando narrativas e representações. Seria possível? Posso esvaziar o assunto, mas no pensamento persistem associações. A pintura não se separa de sua história e a leitura do mundo se dá por indagação, no esforço corriqueiro de compreender a vida, independente do impulso por interpretar pensamentos. Mas sinto falta das coisas intuídas, deslocadas de funções objetivas e que não sirvam para “amarrar” conclusões”.
Referência para artistas de várias gerações, Ralph afirma que ele esforça-se por acompanhar a cena ao seu redor, visitando ateliês e mostras e participando de conversas. “Prevalece hoje em dia a regra do projeto orientando as produções, as curadorias e mesmo o trabalho individual, de tal forma que tudo me parece formatado, antecipando sentidos para assegurar o valor das realizações. Os trabalhos ficam seriados, as mostras muitas vezes ganham títulos pomposos, os textos explicam os supostos conteúdos. Eu compreendo esse movimento, mas sinto falta da naturalidade do ateliê, do processo de indagação espontâneo que ali encontro e lamento que essa não seja a lógica das exposições. Esse é o resgate que pretendo alcançar nesta exposição, trazendo a lógica da produção em ateliê, lugar do pensamento. Reconheço a importância de uma leitura externa sobre o trabalho, mas creio que agora devo reforçar essa posição. Abro mão do modelo vigente para criticá-lo, mas mantenho meu respeito pelo acompanhamento das curadorias. Eu mesmo já fui guiado pela leitura privilegiada de minha produção em textos e processos curatoriais valiosos, e cumpri essa função diversas vezes. Porém, neste momento, essa me parece a forma mais honesta de reclamar o esvaziamento da crítica no sistema das artes plásticas, situação que deveria orientar agora as conversas sobre nossa produção”, completa.