Fruto da parceria entre a Casa Museu Eva Klabin e o Instituto Inclusartiz, o programa de residência artística “ÉDEN” chega a sua segunda edição com a exposição Ultramar, da artista capixaba Kika Carvalho. A individual, que será aberta ao público na Casa Museu Eva Klabin na quinta-feira, dia 7 de dezembro, reúne cerca de 20 obras — incluindo trabalhos inéditos —, entre pinturas, cianotipias, instalações e colagens desenvolvidas a partir da profunda pesquisa da artista sobre a cor azul e a sua função nas relações materiais, históricas e sociais ao longo dos séculos. A curadoria é de Lucas Albuquerque.
Para o curador, a oportunidade de trabalhar junto ao acervo da coleção da Casa Museu Eva Klabin permite pensar projetos curatoriais e de pesquisa capazes de deslocar a produção contemporânea para outros lugares de significação, ampliando o diálogo entre tempos e a fortuna crítica dos artistas convidados.
“A escolha do trabalho de Kika se dá justamente nesse lugar: possibilitar a revelação de dados inerentes ao seu interesse de pesquisa poética que por vezes se vê sublimado pela velocidade do cotidiano. Nesse sentido, o período de pesquisa junto à coleção tão rica instaura outros tempos, tanto de produção como de percepção, que a artista, por sua vez, visa a subverter em sua ocupação. Promover novas leituras não só do presente, mas também do passado, em um pensamento espiralar”, revela Lucas Albuquerque, que também é curador do programa de residências do Inclusartiz.
Natural de Vitória (ES), Kika Carvalho elegeu o azul como objeto de sua pesquisa, ora o relacionando com as paisagens da cidade-ilha onde nasceu e viveu boa parte de sua vida, ora com aspectos da história da pintura. Fazendo uso deste dado afetivo, Kika incorpora o azul como dado de uma memória fotográfica longínqua, que interpela não apenas suas lembranças pessoais como mulher negra, mas também a história brasileira e suas relações além-mar, na grande Kalunga — palavra da língua banto que significa lugar sagrado, de proteção.
O conjunto de obras selecionado pela curadoria para integrar “Ultramar” conta com trabalhos profundamente atravessados pela vivência da artista em Luanda, capital da Angola, onde participou de uma residência artística em 2022, sendo este o seu primeiro atravessamento Atlântico. Para esta exposição, Kika também preparou obras inéditas que refletem suas experimentações em outras técnicas para além da pintura, como a cianotipia e processos de fotografia analógica. Estes trabalhos propõem ainda um confronto entre a utilização simbólica da cor azul no Egito antigo e sua posterior valorização na imagem sacra cristã, por meio do diálogo direto com itens presentes no acervo da Casa Museu Eva Klabin.
“Eu produzi trabalhos específicos para esta exposição porque acredito que essa é uma oportunidade única de dialogar face a face com peças de uma cultura que contribuiu muito para a minha pesquisa e para o meu fascínio pela cor azul. É também uma ocasião oportuna para discutir sobre a história da arte e sobre a guerra de narrativas que cerca o deslocamento do Egito do continente africano. Quando pensamos nos feitos dos antigos egípcios, essa história se desloca daquele continente ou até mesmo do Planeta Terra, abrindo a possibilidade de extraterrestres terem contribuído com grandes feitos. Algo que me fascina muito”, conclui a artista.
Idealizado pelo Instituto Inclusartiz e realizado na Casa Museu Eva Klabin, o programa “ÉDEN” tem como objetivo investigar a casa e a coleção resultante das oito décadas de colecionismo de Eva Klabin (1903-1991). Contando com um dos mais importantes acervos de arte clássica do Brasil, que abrange um arco temporal de quase 50 séculos, a união das duas instituições se funda no desejo de convidar artistas contemporâneos para promover novas frequências dentro da casa e da coleção por meio da criação de trabalhos inéditos, feitos a partir da pesquisa realizada em conjunto com as equipes de curadoria e museologia. A primeira edição do programa contou com a participação da artista carioca Ayla Tavares e culminou na exposição “USTÃO”, realizada entre maio e julho de 2023, também sob a curadoria de Lucas Albuquerque.