A Mitre Galeria inaugura, no dia 30 de outubro, em Belo Horizonte, Rio-Correnteza — primeira exposição individual de Juliana Matsumura no Brasil. A mostra reúne uma série de trabalhos que exploram as relações entre memória, ancestralidade, diáspora e pertencimento, delineando um percurso sensível sobre como as experiências individuais e coletivas se entrelaçam na formação de identidades múltiplas e em constante movimento.
Parte das obras foi desenvolvida durante a residência artística Xakra, localizada na Serra da Moeda, em Brumadinho (MG). Conduzido pelos artistas Benedikt Wiertz e Joseane Jorge, o espaço é dedicado à cerâmica e à culinária, fomentando encontros e trocas entre artistas e comunidades locais. Nesse ambiente, Juliana aprofundou processos experimentais com cerâmica e madeira, resultando em peças onde gesto, matéria e memória se fundem de maneira orgânica.
A artista trabalha com materiais como papel, argila, gesso, juta, madeira, tijolo e metal, evocando os cinco elementos taoístas — metal, fogo, água, terra e madeira. Essas matérias remetem não apenas ao mundo natural, mas também ao corpo e ao tempo, àquilo que se molda e se transforma. O uso do papel carbono, técnica que remete à infância dos anos 1990 e à ideia de inscrição e transferência, confere ao trabalho uma dimensão corpórea e afetiva: cada marca revela o que permanece e o que se perde, como um registro de passagem.
O percurso de Matsumura parte da investigação sobre o Butsudan — altar doméstico da tradição japonesa dedicado à memória dos ancestrais — e se expande em direção a outras geografias afetivas. Ao adentrar também a história materna, ligada ao sertão baiano, a artista costura memórias de origens distintas, construindo uma cartografia da ancestralidade que ultrapassa fronteiras nacionais e simbólicas. Essa recombinação de referências — o algodão, o mamão, o caqui, a arquitetura das casas das avós — dá forma a um campo poético em que o pertencimento é sempre um projeto em aberto.
Em Rio-Correnteza, o trabalho de Juliana se move como a própria água: paciente, poroso, capaz de contornar, dissolver e recompor. Suas obras surgem como fragmentos de um mesmo rio — um mapa feito de dobras, fissuras e recomeços. Nas frestas desses encontros materiais e simbólicos pulsa a força vital das histórias que atravessam gerações: um fluxo contínuo entre corpo, tempo e memória.

