Gonçalo Ivo | Pinakotheke Cultural

Pinakotheke Cultural, no Rio de Janeiro, abrirá para o público a exposição Gonçalo Ivo – Zeitgeist, com 79 pinturas criadas pelo artista nos últimos cinco anos, das séries Le jeu des perles de verre (Jogos de contas de vidro), Cosmogonias, Cardboards e L’inventaire des pierres solitaires (Inventário das pedras solitárias). A curadoria é de Luiz Chrysostomo de Oliveira Filho, presidente do Conselho do Museu de Arte do Rio, amigo do artista, e que acompanha seu trabalho há mais de trinta anos.

Luiz Chrysostomo de Oliveira Filho afirma que a exposição e o livro refletem “as inquietações do artista nos últimos cinco anos, vindo de uma sequência de vivências intensas, descobertas e afetos”. “Manifesta um profundo desejo de partilhar uma longeva trajetória de arte, marcada por percepções corajosas e fragmentadas de nossa contemporaneidade. Lidar com a não linearidade que a vida nos impõe e os espantos decorrentes dela, como bem disse o poeta Gullar, revela que a persistência é uma característica diferenciada da construção humana. Insistir, rever ou retornar não são contradições, mas ações que nos permitem existir e revelar um outro lado possível”, diz. Ele acrescenta que Gonçalo Ivo é “considerado um dos maiores coloristas contemporâneos do país”. O curador enfatiza que suas séries de trabalho “falam do tempo como tema central, buscam dar conta de um presente mutante, desobstruem uma voz interna que estava por vezes emudecida”. Outros aspectos do artista assinalados por Luiz Chrysostomo são “a facilidade com que navega e deglute manifestações do românico ao barroco espanhol, de culturas africanas ancestrais ao modernismo europeu”, e que se “confunde com o domínio técnico com que manipula pigmentos, têmperas e óleos”.

Max Perlingeiro, diretor da Pinakotheke Cultural, destaca que o público vai se surpreender com a exposição. “Além de trabalhar as cores como ninguém, ele está em constante mutação, como pode ser visto nessas três séries novas que surgiram em 2018”. Ele conta que a ideia do livro e da exposição surgiram ao ver a pintura “Cosmogonia – Melancolia, para Giacomo Leopardi e Francisco de Goya” (2021), na montagem da exposição no Paço Imperial, acompanhado por Luiz Chrysostomo: “Tive a certeza de que iria entrar nesse universo mágico da produção do seu novo livro. E que livro!”.

O diretor da Pinakotheke recorda o período em que Gonçalo Ivo ficou sozinho entre início de março e final de maio de 2020, devido à pandemia, em uma residência artística da Josef & Anni Albers Foundation, em Bethany, Connecticut, nos EUA. “Naquele momento, o artista, cidadão do mundo, que tem à sua disposição uma floresta exuberante em Teresópolis, com dezenas de hectares de mata virgem, ateliês muito bem equipados e bibliotecas, agora estava isolado e desolado”, conta. “Para um artista, ou ele sucumbe ou submerge muito mais forte. Durante seu exílio involuntário, comunicávamo-nos com muita frequência. Recebi durante muitas semanas, quase que diariamente, dezenas de imagens. Vi nele a necessidade de produzir e de mostrar”, escreve Max Perlingeiro na apresentação do livro.

Em seu texto no livro que acompanha a exposição, Luiz Chrysostomo fala da importância das casas-ateliês de Gonçalo Ivo, e de suas residências artísticas como “um olhar expandido de próprio ateliê”. “São deslocamentos de zonas de conforto, desejo pelo embate e busca de novos referenciais. A sensação dessa nova fonte externa de alimento é para o artista tão fundamental quanto o isolamento no espaço que ele já conhece. É também a possibilidade de explorar outras identidades, as incertezas e os ecos de seu próprio tempo, seu Zeitgeist mais íntimo”.

“A rotina e os ritos são frugais e monásticos. Gonçalo pinta, aquarela, desenha, lê e escreve diariamente, desde antes do sol nascer. A disciplina é parte necessária do ofício. Pinta sentado, em pé, deitado no chão ou apoiado sobre um banco ou escada. Trabalha sem assistentes, usando recursos externos apenas quando necessita esticar telas de mais de oito metros ou requer algum apoio para carregar grandes troncos de árvores tombadas”, salienta o curador. “O ateliê é parte central de sua existência enquanto indivíduo e ser social. Lá convivem variedades de objetos, ossadas, plantas secas, insetos mortos e pedras, com obras criadas ou adquiridas para sua coleção particular. É onde o mundo é deglutido e processado. Lugar de interlocução, laboratório de ideias”, diz. “Local recluso onde se pode duvidar, errar, repetir e domar suas mais intimas questões. É também local de angústia e solidão, muitas vezes necessárias para fazer brotar”.

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